“A gente ainda vai incomodar muito”, disse Rafael Corrêa na noite de premiação do Cine PE 2024. A frase do quadrinista convertido em cineasta (e ator) define muito do que foi viver essa edição do festival para mim. Rafa falava do incômodo que PCDs precisam instalar para que discutamos acessibilidade, mas espraio o desconforto a outros lugares — e nem me refiro à dengue que me laçou na segunda metade do festival até o final da viagem.
Na minha atuação, quero incomodar as engrenagens viciadas do meio cultural brasileiro, coalhado de nepobabies, herdeiros e todo pessoal que veio de berços socialmente muito mais privilegiados do que eu. Quero incomodar quem tá acostumado demais a ser mimado. Quero incomodar que não tá nem um pouco acostumado a ser contrariado. Quero incomodar quem quer falar demais e ouvir bem pouco.
Entretanto, o público do Cine PE nunca será alvo desses incômodos, já que me orgulho tanto de hastear a bandeira da formação de plateia. É claro que reflexões potencialmente desconcertantes farão parte da programação fílmica. Afinal, não foi à toa que nossa mostra paralela ganhou o nome Inquietações.
Por outro lado, longas sessões no gélido Cine Teatro do Parque é algo a se repensar. Adiante, vamos tentar controlar a gula cinéfila, provavelmente com uma mostra competitiva de curtas nacionais mais enxuta. A inteção é construir uma experiência menos cansativa e mais prazerosa. Um pouco mais de cuidado nessa construção do programas é essencial até na minha vivência individual, uma vez que assistir à recepção do público é um dos meus maiores prazeres como curador.
Tal espírito de mudança não pode perder de vista o que construímos de bom e desejamos manter. Isso também se faz presente na programação, com tantos cineastas retornando a exibir seus filmes conosco. Consolidar as parcerias e acompanhar o avanço desses artistas indica que há resultados positivos a apresentar.
Há o turbilhão que se deseja para o futuro e as alianças a se fortalecer, mas também há as raízes das quais não escapamos — e nem queremos. Nessa seara, vale mencionar a presença durante o Cine PE 2024 de dois amigos cujos trabalhos fizeram de mim o curador que sou. No júri de curtas desse ano, estava o cineasta André da Costa Pinto, que fundou Comunicurtas em Campina Grande (PB), o primeiro festival a me apresentar a efervescência de uma cena cinematográfica fora do eixo Rio-SP. E entre os produtores estava Alexandre Soares, diretor do Curta Taquary, o maior festival do interior pernambucano, que me mostrou a enorme riqueza audiovisual que se encontra sem precisar cruzar as divisas estaduais.
Para além do Cine PE, no restante da minha vida profissional, as coisas já foram piores. Se em 2024 eu ainda não precisei montar fachadas de agência bancária em dias com temperatura máxima de 7º C, já temos um avanço. Contudo, meu currículo mereceria um tiquinho mais de paz financeira.
Então, se você reconhece que estou me doando bastante ao nosso amado cinema brasileiro, faz uma forcinha e veja se não tem por aí um job pra me indicar. Redação, oficinas, palestras, edição de texto, tradução, consultorias em projetos e roteiros… O cardápio de serviços por aqui é bem variado. Bora dar aquela ajuda porque ainda é um mistério como vou pagar meu próximo aluguel.