Desde o comecinho da minha adolescência, nutro um amor por curiosidades. Com o acúmulo dos anos, esses fragmentos de informações se ligam na minha rede neural, o que faz de mim um generalista. Como eu sempre digo, eu sei um pouquinho de quase tudo, ao mesmo tempo em que sei um montão de coisa sobre quase nada.
Fico confortável nesse manancial variado de saberes, mas nossa sociedade tende a pedir por mais e mais especialistas. Aí cabe ao generalista achar um jeito de navegar por esse mar de especializações. Ajuda saber as limitações, tal qual o marinheiro consciente que astrolábio só funciona durante o nascer e pôr do sol, quando temos luminosidade suficiente para ver a linha do horizonte e há corpos celestes visíveis no céu para termos referência. Mas isso não é o tema do texto!
O mundo não respeita as gavetinhas que os homens criaram e chamam de áreas do conhecimento. Não importa que biologia e astronomia estejam em livros separados para a taxa de crescimento de uma concha ser semelhante à expansão do universo. Aliás, nosso saber da ciência mais antiga é bem tosco. Afinal, 85% do que existe no universo é a famigerada matéria escura, que a gente não faz muita ideia do que é. Aí tudo que a gente calcula sobre interações dos astros tem de levar em conta a tal matéria escura (e a energia escura também)… mas isso não é o tema do texto!
Um cozinheiro generalista, por exemplo, se beneficia de conhecimentos químicos na hora de adaptar uma receita e criar novos pratos. Afinal, a gente sempre pode substituir um tipo de gordura por outro e mudar o ácido que vai embasar uma marinada. Se bem que, na cozinha, qualquer bebida alcoólica é considerada ácida e eu não sei exatamente o pH da cachaça… mas esse não é o tema do texto!
Existem trabalhos (ironicamente bem específicos) que são bons para generalistas. Compor quiz para internet, comentar desfile de escola de samba e escrever roteiro de vídeos educativos (para todas as disciplinas, lógico). A propósito, na Pedagogia existe até um nome para esses pontos de contato entre áreas do conhecimento: interdisciplinaridade. Por exemplo, o advento do motor a vapor foi essencial para desencadear a Revolução Industrial, apesar de já se saber do potencial do vapor desde a Antiguidade. Essa inovação só não aconteceu antes porque a humanidade funcionava com regimes de escravidão ou servidão, aí ninguém se preocupou em fazer maquinários mais eficientes do ponto de vista de uso de outras fontes de energia… mas isso não é o tema do texto!
Conhecimento não é estanque. Os conceitos de uma área impactam em outra e vale a pena ter alguém de olho nessas conexões. Se os saberes formam um mapa, os generalistas trilham os atalhos do campo, pois cada encruzilhada leva a novas descobertas. Somos os Exús da inteligência.